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Keep the dream alive!
Não era a primeira vez que saia de casa com óculos escuros. Com uma camisola de gola alta e manga comprida em pleno verão. Não era a primeira vez que caia de umas escadas, tropeçava, batia com a cabeça numa porta. Não era a primeira vez que exagerava na maquilhagem . Não era a primeira vez que dizia às pessoas que estava tudo bem. Não era a primeira vez que se esquivava às perguntas dos médicos e enfermeiros nas várias idas de urgência ao hospital. Não era a primeira vez. Não era a primeira, nem a segunda, nem a terceira. Na verdade já tinha perdido a conta das quedas, das vergonhas, das lágrimas, dos estalos e dos empurrões.
Era como se fosse um ciclo: ele zangava-se, ele batia-lhe, ele pedia-lhe perdão e ela aceitava. Mais uma vez. Mas como não o perdoar? Como não o perdoar quando os seus olhos lhe prometiam que aquela era a última vez? Quando ele implorava que a aceitasse de novo?
No fundo, a culpa era sua. Era ela que atrasava o jantar. Era ela que não respondia às suas perguntas imediatamente. Era ela que se distraia com a televisão. Era ela que não passava a roupa em condições. Era ela que demorava mais o seu olhar num rapaz que passava pela rua. Ou então a culpa era da bebida. Mas, ninguém é perfeito e ele tinha esse pequeno problema: abusava da bebida e perdia a noção das coisas.
As pessoas não entendiam. Quantas vezes a mãe lhe tinha dito que já tinha percebido tudo, que não valia a pena negar e que ela não devia sujeitar-se a tamanha humilhalção... Ou então, quando a sua melhor amiga tinha ameaçado que denunciaria o caso à polícia e ela tinha implorado e negado veemente que nada se passava...
A verdade é que elas não percebiam o amor que ela sentia por ele. Era o seu amor a razão para o perdoar sempre. A razão por acreditar cada vez que ele dizia que era a última vez.
Às vezes pensava em fugir; desaparecer dali, mas não tinha forças. Aliás, nem sequer sabia se era isso que queria realmente. Se conseguiria ser feliz sem ele. No fundo ela amava-o e não tinha forças para o deixar nem para dizer que não. Amava-o acima de tudo. Amava-o acima de si própria.
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